Texto publicado no jornal "A Comarca de Arganil"
Por: Teodoro A. Mendes
Em: 2008-09-02
Mudaste o aspecto e a tua presença. Mas não mudaste a identidade – o mais importante - e o tempo, porque, enquanto a primeira continua a ser a tua carta de apresentação às gentes que te querem bem, a segunda é o marco a balizar o teu caminho, uma lonjura que já vai em 108 anos.
Chegas, agora, uma vez por semana – mas continuas a ser bem recebida! – graças ao esforço dos que continuam a acreditar naquela alavanca que tu és e de que falaste no “Programa” que encheu a tua 1ª página no dia 1 de Janeiro de 1901.
Parabéns pela tua luta, que é bem o espelho de todos os teus ilustres timoneiros, desde os teus ilustres fundadores Eugénio Moreira e A. José Rodrigues, que viram longe o teu futuro, e todos os que, até agora, têm sido fiéis à ideia do principio, a quem presto a minha viva homenagem.
Todos eles em conjunto com uma plêiade de homens, que mais directamente ao longo de tantos anos te têm impresso e daqueles milhares de colaboradores que te escrevem, todos têm sido os cabouqueiros atentos às vicissitudes do tempo que te têm marcado o caminho.
Não desesperes por chegares agora, uma só vez por semana. Lembra-te, que no começo já foi assim. Saías aos sábados para que aos Domingos houvesse tempo para ti.
Percorreste um longo caminho e reencontraste agora, o caminho inicial.
Que bom, não é?
Pensa como é uma felicidade não ter perdido o princípio.
O reencontro é sempre um sinal de vida, porque quem sabe, se vai ser daqui que vais voltar a sonhar com outro destino?
O importante é estar.
Pensa no que tens feito, a começar pela tua vitória contra os coveiros da Imprensa Regional que desde o ano de 2001, quando o Governo de então, anunciou o fim da comparticipação a 100 por cento para “moralizar o sector”, e tu, galhardamente, desrespeitada mas firme apesar de velhinha de tantos anos e de tantos percalços, continuaste a fazer pela vida, porque sabias – ao contrário deles – como eras importante, embora continuasses a manter aquele ar de jornal humilde, que quer continuar como a pedir desculpa aos poderosos de ainda teimar em viver.
Continua assim. Eles passam e tu vais ficar.
Vais ficar, por todos os que te querem bem, onde eu — teu respeitoso colaborador — me incluo desde os tempos antigos em que me tornei admirador das tuas páginas.
Era, então, um jovem.
Com aquele ar de quem já se julgava gente, um dia – onde isto já vai! - tive um sonho: escrever para ti.
E assim aconteceu.
Estávamos na década de setenta do século passado. Já lá vão muitos anos.
Mas não esqueço.
Guardo a tua primeira carta, mandada por esse Homem bom que era ao tempo teu Director. Chamava-se João Castanheira Nunes. Escreva... escreva – disse-me ele – e eu embalado pelo seu sorriso afável, num certo dia em que o visitei, escrevi – e continuo a escrever - nem sempre, certamente, com o acerto que tu mereces.
Depois dele, guardo cartas amáveis de outros teus timoneiros e muitos telefonemas, onde falámos da tua vida, ou melhor, das nossas vidas, que num dado passo, a minha própria vida passou a confundir-se com a tua.
Razão suficiente para eu me ter ido alarmando, ao longo do tempo com a asfixia de que foste sofrendo, pois da vida estuante dos três números semanais – que belos tempos! – passaste a dois e., agora, a um.
Ou seja, reduziram-te à expressão mais simples.
Mas deixa lá.
O reencontro com o passado tem de ser entendido como uma felicidade.
Vais continuar a viver. É uma fé que eu tenho.
Eles, os tais, que não te têm amado – como merecias – esquecem-se que a imprensa regional, a que alguns chamam e com verdade, imprensa de proximidade é, nos tempos que correm, seguramente, o único veículo que faz frente à TV, à Rádio e à NET, pois ainda consegue alguma penetração num público fiel de leitores.
Restrito, é certo, mas interessado no meio das suas origens.
É lamentável que o actual Governo que temos – e todos os demais – também não tenham querido saber disto, que não deixa de ser uma acção concertada de desprezo pelo interior do País, esvaziando-o de gentes e, logo de estruturas, como tem acontecido.
Tu és uma dessas estruturas... das tais que querem deitar abaixo.
Por motivos que nos escapam – há quem diga que é por eleitoralismo – eles têm preferido gastar milhões de subsídios com a chamada grande informação, especialmente a TV do Estado, sem cuidar que tu – e já agora, outras como tu – deviam ser estimuladas como agentes de promoção da leitura e do gosto pelos jornais.
Mas não.
Até parece de propósito.
Retiram-te a possibilidade de chegares a potenciais leitores, indo ao ponto de se esquecerem dos que foram para o estrangeiro – ao alterarem o “porte pago”, que era um modo de contribuição que te permitia respirar.
Porquê?
Não sei. Mas havemos de lhes perguntar, um dia.
Que maldade foi esta? A medida é política ou economicista?
Se é política é irracional, porque os jornais regionais com provas dadas – como tu — deviam ser considerados de interesse público e, como tal, alvo de um tarifário acessível, que possibilitasse a sua expansão.
Se é economicista, é lamentável, por nos parecer que o dinheiro gasto anualmente com o porte pago não é de molde a abanar o Orçamento do Estado.
Mas que queres?
O poder é deles.
E quem manda hoje, não são os princípios.
É a economia que tudo perverte.
Sinais dos tempos enviesados que vivemos, onde perante a prática do fecho de Maternidades, Centros de Saúde, Escolas e outros Serviços, parece, não ter importância o fecho de jornais regionais.
Há uma nova cartilha economicista, minha velha “Comarca”... e, há, por aí, uns certos senhores do mundo e de outros, que o não sendo, também se vergam a esse poder sem rosto e sem vergonha.
Desculpa uma carta tão longa.
Foi sentida, podes crer.»
Nota: Esta opinião foi publicada no jornal "A Comarca de Arganil" por este se encontrar activo. Hoje não seria possível porque a publicação do referido jornal está suspensa. Queremos manter esta situação? ttp://laacomarcadearganil.blogs.sapo.pt/404.html